O que é especulação imobiliária?

O espaço urbano é um produto social, onde as sociedades imprimem suas marcas, suas obras, aspectos da sua cultura e do seu modo de vida, e as contradições que as circunscrevem. Em última instância, é possível afirmar que a cidade materializa as relações sociais presentes naquele espaço e época, e processos como a gentrificação, favelização e a segregação socioespacial fazem a manutenção dessa materialidade, expressando a constante dominância política e econômica de um grupo sobre o outro.

As metrópoles e centros urbanos são alvos mais recorrentes do interesse das classes dominantes, os quais se expressam através de processos relacionados à mercantilização do solo e à especulação imobiliária, em que os agentes imobiliários produzem condições favoráveis à reprodução do capital mediante a configuração de novas centralidades, da fabricação de valorização simbólica do espaço e da expansão forçada e artificial das manchas urbanas.

Mas, afinal, o que é especulação imobiliária?

Primeiro, o que é especular? O termo denota a suposição de um sujeito acerca de algo, de uma possibilidade, uma promessa de algum acontecimento futuro. Desta maneira, ao se pensar na especulação de objetos materiais, pode-se pensar em reter ou guardar algo com a esperança de realizar uma barganha favorável e lucrativa no futuro, quando o valor que será recebido for superior ao valor que esse determinado item valia no passado. No caso dos imóveis, esse fenômeno ocorre quando grupos ou sujeitos adquirem deliberadamente a posse de terras ou construções visando futuras negociações. Ou seja, é um tipo de aquisição sistemática de imóveis e terras por parte de investidores, as quais não possuem a finalidade de uso como moradia ou como outra atividade útil à sociedade, mas sim com uma expectativa gananciosa de lucro.

Figura reproduzida do site: https://mercadopopular.org/economia/voce-sabe-o-que-e-especulacao-imobiliaria-2/

 Neste sentido, deve-se ter em mente que, em uma economia capitalista, a terra representa uma mercadoria que possui seu valor estabelecido a partir de duas dimensões: seu valor de uso e seu valor de troca. O primeiro diz respeito à sua utilidade, por exemplo: uma casa é útil para se morar, portanto, isso determina seu valor de uso; o segundo é conferido pela possibilidade de negociação transmitida pelo espaço, como exemplo: um prédio no centro que pode virar uma loja ou um outro prédio em um bairro qualquer na cidade que pode, futuramente, valorizar e se tornar um bairro “nobre”. No caso das especulações imobiliárias, é o valor de troca que importa e, é por este motivo, que após compradas as propriedades alguns investidores deixam-nas ociosas e vazias, pois o que importa é a valorização que ela pode sofrer.

A valorização de um espaço pode ocorrer de diversas formas, seja por modificações ao seu entorno, criação de novos eixos de circulação, disponibilização de serviços mais diversificados, implantação de parques ou por melhorias na infraestrutura. Essas transformações não alteram a posição original do espaço – que é fixa – mas são capazes de impactar expressivamente o valor de troca dos imóveis.

Além disso, ao gerar a expansão do tecido urbano, as especulações promovem o desequilíbrio entre a oferta e a demanda por terras e imóveis, acarretando uma escassez artificial. Desta forma, os investidores imobiliários aumentam seus lucros e as pessoas em busca de uma moradia são economicamente selecionadas para cada região, alocando-se, assim, os ricos em bairros repletos de serviços, comércios e infraestrutura e as pessoas pobres, às margens da cidade, muitas vezes, em ocupações irregulares. O que demonstra que os interesses dos grupos dominantes se sobrepõem aos interesses coletivos, simultaneamente, o valor de troca assume mais relevância que o valor de uso.

Figura reproduzida do site: http://sp.unmp.org.br/mais-uma-vez-alteracoes-no-plano-diretor-e-no-zoneamento-sao-propostas-de-forma-irregular-pela-camara-dos-vereadores/

Ademais, muitas transformações que agregam valor aos espaços são de origem pública, um processo que seria natural, uma vez que é dever do Estado fazer as melhorias de infraestrutura e de ampliar a acessibilidade de determinados serviços, como transporte, lazer, cultura etc; mas não é, pois ele está atravessado pela corrupção e por interesses individuais de políticos, os quais podem fazer acordos visando lucrar juntamente com os investidores após a valorização de um espaço.

Portanto, pode-se concluir que a terra, em uma economia capitalista, é uma mercadoria, disputada por diferentes agentes sociais, em que o mercado atua diretamente e produz profundas condições de desigualdade, as quais, de certa maneira, materializam as contradições presentes no próprio sistema econômico. A lógica especulativa pode suscitar diversos questionamentos acerca da quantidade de pessoas desabrigadas diante de tantos imóveis ociosos aguardando a valorização, das prioridades do poder público que parece compactuar constantemente com os interesses privados ao invés de garantir os direitos e a dignidade dos grupos marginalizados e tantas outras reflexões éticas e sociais que permeiam a questão da moradia. São justamente essas inquietações que movem movimentos sociais que reivindicam o direito à terra e à moradia, como o MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) e o MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem Teto).

 

Postagens mais visitadas deste blog

Floresta Temperada - 8 ANO

Projeções cartográficas: como o globo se transforma em mapas planos - 6ºANO